Fui deitar-me... escondi-me do frio no quentinho... empurrei-me bem para o fundo da cama... e ali fiquei, a ouvir este álbum.
Fragilidades. Era o que importunava o meu pensamento. E sem querer, sinto o salgado que me escorre devagarinho dos olhos. Sem querer. Fragilidades. Todos as temos. Uns escondem-nas melhor do que outros. Fragilidades. Como é que uma simples palavra, seja ela proferida ou escrita, consegue despoletar subservientemente o que está imbuído na nossa constituição?
Mas a verdade é que o salgado deslizou até aos meus lábios... molhei-os então no que pensava eu ser salgado... no entanto, senti doce. Voltei a molhá-los... e sim, era doce que sentia... e acabei por colocar esta música em repeat. Acompanhou-me toda a manhã... e agora, não resisto a colocá-la aqui.
Sentas-me no teu colo. Seguras-me pelos braços e manténs a distância suficiente entre os nossos corpos... para demoradamente percorreres o meu rosto, o meu pescoço, os meus ombros, o meu peito... com o olhar... esse olhar que diz tanto... sem palavra alguma. Acaricias-me o rosto com a mão, afastas o cabelo que emoldura o meu rosto... colocando firmemente a mão no meu pescoço... Sinto o meu coração que palpita tumultuosamente na ponta dos teus dedos... matas-me de desejo!
Mantendo sempre a mesma distância, como que para poder apreciar o espectáculo... Acaricias-me agora o peito... e os teus olhos deliram deliciosamente perante o frio que se torna tão visível sob a seda índigo... entreabres ainda mais a blusa, revelas o negro brilhante que me cobre os seios... inclinas-te e pareces querer beijar o frio do meu corpo... e com o calor da tua boca, procuras mitigar esse frio. Sinto os teus lábios quentes que envolvem a pele fina, contorcida... sinto a tua boca quente, que envolve... ora um , ora outro... sinto a tua boca que desliza sinuosamente para o pescoço... que se demora nos ombros... Meu Deus... que doce tormento!
Quero lançar-me impetuosamente nos teus lábios, no teu beijo... e tu, pareces manter-me hipnotizada sob o toque das tuas mãos. Já não é o frio que sinto... é o calor que me abrasa a pele!
A chuva tempestuosa parece perfurar impiedosamente a areia, a cada gota... com cada gota... mas não, apenas a beija.... acaricia.
O mar ruge, rebentando furiosamente as ondas contra os rochedos. Parece querer destrui-los, mas não... permanecem imóveis, intactos perante a sua fúria... e afinal, apenas se serve deles para lançar as suas ondas ainda mais alto.
As tuas mãos deslizam agora até ao fundo das minhas costas... tal como a onda afaga a areia. Sinto o seu aperto firme... que me pressiona ainda mais contra ti... balanças o meu corpo... sobre o teu... queres levar-me à loucura... seguramente. Vês-me lamber os lábios, mordê-los... e só então, só assim é que finalmente procuras o meu beijo. Finalmente, finalmente, bebo a doçura da tua boca... finalmente. Como te quero, como te desejo...
Balançamos nós, agora juntos, em uníssono, como um só. Já não há o meu querer... e o teu querer... apenas um querer. Parecemos acompanhar a cadência das ondas do mar. E acompanhamos. Mergulhamos na imensidão do calor da nossa paixão. Entregamo-nos. Rendemo-nos. Um ao outro. Sucessivamente, como o vaivém das ondas... eu sou tua... e tu és meu... e eu sou tua... sempre tua. O desejo parece inflamar cada vez mais. Cedemos... cedemos... cedemos.
E agora... já não acompanhamos a cadência das ondas... são elas que procuram seguir o nosso ritmo, são elas que procuram acompanhar-nos e... falham, como falham...
Assim como o mar culmina o seu abraço com a espuma da rebentação... também nós explodimos de prazer... Como a areia húmida brilha docemente sob a luz desta lua que nos ilumina... também a nossa pele reflecte a doçura perspirada pelos poros. Como o mar, agora calmo, jaz rendido aos pés da praia... também nós... assim permanecemos... neste doce abraço... doce, tão doce...
Os teus olhos castanhos exalam a doçura do mel... procuro bebê-lo mais um pouco dos teus lábios... só mais um pouco... e agora sim, vamos para casa... aquela, na praia, sem vizinhos por perto.
Espero-te na entrada. Veste-te... linda, como sempre.
Visto a saia preta. Blusa... de seda índigo. Sóbria. Serena. Sapato de tacão alto. Trench coat negro como a noite. Cabelo solto.
Uma multidão parece assomar aos meus olhos. E eis que os meus olhos se centram em ti. Alto, moreno... que perdição de homem, penso eu. Os ombros largos envergam o casaco sóbrio, delineando o porte altivo que te define. Homem seguro de si. Detentor do abraço mais forte, mais envolvente... mais inolvidável.
Ofusco-me no brilho dos teus olhos. Meu Deus, sempre brilharam assim? Prendo-me nesse teu sorriso delicioso de menino. Sorrio também... e é o teu sorriso que conduz os meus passos.
Envolves-me no calor do teu abraço. Acaricias o meu rosto com o teu. E eu, deixo que me envolvas... e procuro o calor do teu corpo. Refugio-me do frio no interior do teu casaco. Encosto o meu corpo ao teu. E o calor do teu... revela o frio no meu. Aquela pele fina e sensível, cede, como cede... e mostra a revolta ao frio. Abraçados desta forma, penso em como me fazes gostar deste tempo...
As portas abrem-se. A multidão, querendo entrar, pressiona-nos ainda mais, um contra o outro. Sinto o calor da tua pele. Sinto o frio do meu corpo que se insinua perante o teu. Mostro-te o sorriso mais doce... ao dizer-te:
É do frio... não penses noutra coisa.
Respondes-me com uma gargalhada doce, jovial... parece divertir-te a minha sinceridade. À medida que a multidão se esforça por entrar, empurram-nos ainda mais... um contra o outro. Cedemos ao beijo mais doce e apaixonado de todos os tempos. Nada mais existe. Nada. Tudo o mais desaparece. A multidão. A cidade. Só nós dois parecemos existir sob o céu estrelado. Até o frio evapora sob o calor que agora nos envolve. Com o meu corpo firmemente pressionado contra o teu, sinto esse mesmo calor que se apodera de ti. Munida de um sorriso repleto de malícia, digo...
Isto... é que já não é do frio...
De sorriso rasgado, enlevado pela menina que sabes que não sou... abraças-me ainda mais... e beijas-me... e perdemo-nos nesse beijo intemporal.
Lá dentro. Sentados. Em silêncio. No entanto, falando constantemente... incessantemente. Seguras a minha mão esquecida na tua perna. E assim ficamos. E antevejo que em momentos, o teu braço me envolva, e me segure junto de ti. E assim ficamos... até que termine o espectáculo.
Caminhamos em direcção à praia. Vamos passear, dizes tu. Está uma noite... perfeita. Expões-me ao frio. Sei o que procuras. Sei o que queres.
Deixas que o vento embata no meu rosto... esperas as faces rosadas pelo frio, os lábios que escurecem naturalmente. Procuras que a pele fina e sensível do peito ceda aos avanços do frio. E aí, aí, envolves-me, proteges-me no calor do teu corpo. Acalmas o frio com a doçura do teu beijo. Delicias-te com os meus lábios frios... Até os envolveres completamente no calor da tua boca.
Vamos para o carro, digo-te eu agora. Presenteias-me com esse sorriso de menino, esse olhar apaixonado... que me entontece. Onde estiveste tu?
Vamos para o carro. Não temos tempo... vontade... de chegar a casa. Aquela, na praia, sem vizinhos por perto.
Final do dia. A caminho de casa, aquela, na praia, sem vizinhos por perto.
Os sentidos que se embriagam com o sal vivo que balança nas ondas: começo a sentir... Começo a lavar a alma. O som intemporal que se apodera da minha mente, afastando do pensamento os restantes minutos do dia. A minha alma que parece reocupar o corpo, o corpo que lhe pertence, que é seu. Eu, que volto a mim... aos poucos... e, aos poucos, volto a reconquistar o espaço que é meu, que apenas a mim pertence.
Depor as armas, despojar-me da armadura. Nada se pode comparar a entrar em casa... e ser eu. Libertar-me das roupas que carrego, permitir que a pele recupere o fôlego. Respirar. Toda ela respira. Toda ela se oferece ao frio que se faz sentir. Toda ela procura... sentir.
A água quente do chuveiro percorre agora o meu corpo por inteiro. Olhos fechados. Ouvidos que sucumbem à passagem da água. A respiração entrecortada, dificultada. Rendo-me ao calor da água que percorre o meu corpo. Procuro que me percorra continuamente. Procuro... lavar a alma.
Permito que o entorpecimento me invada, e se apodere de mim. Inclino a cabeça para trás, e o cabelo molhado balança, brinca... quase provoca. Penso em ti.
Procuro aconchegar-me no sofá, junto à lareira acesa. Refugiar-me... junto ao calor. Procuro manter-me quente. A música parece sucumbir à melancolia. A luz parece abater-se sob o peso do mesmo sentimento. E ali fico, à espera.
Chegaste. Com o teu sorriso iluminaste a sala. Prendeste o meu olhar e não mais o soltaste. Envolveste-me num abraço do tamanho do mundo. Falaste. Respondi com silêncio. Não procuraste resposta. O meu silêncio bastou.
Senti os teus braços envolverem-me num abraço sem medida, sem tempo. Ficamos assim, os dois, em silêncio... falando. Aos poucos, invade-me o calor do teu abraço, do teu corpo. Combate a melancolia. Afasta-a de mim.
Encontro o teu olhar. Abraço o castanho profundo... e mergulho no teu sorriso. Beijas-me a pele. E com cada beijo, mostras que me amas.