Final do dia. A caminho de casa, aquela, na praia, sem vizinhos por perto.
Os sentidos que se embriagam com o sal vivo que balança nas ondas: começo a sentir... Começo a lavar a alma. O som intemporal que se apodera da minha mente, afastando do pensamento os restantes minutos do dia. A minha alma que parece reocupar o corpo, o corpo que lhe pertence, que é seu. Eu, que volto a mim... aos poucos... e, aos poucos, volto a reconquistar o espaço que é meu, que apenas a mim pertence.
Depor as armas, despojar-me da armadura. Nada se pode comparar a entrar em casa... e ser eu. Libertar-me das roupas que carrego, permitir que a pele recupere o fôlego. Respirar. Toda ela respira. Toda ela se oferece ao frio que se faz sentir. Toda ela procura... sentir.
A água quente do chuveiro percorre agora o meu corpo por inteiro. Olhos fechados. Ouvidos que sucumbem à passagem da água. A respiração entrecortada, dificultada. Rendo-me ao calor da água que percorre o meu corpo. Procuro que me percorra continuamente. Procuro... lavar a alma.
Permito que o entorpecimento me invada, e se apodere de mim. Inclino a cabeça para trás, e o cabelo molhado balança, brinca... quase provoca. Penso em ti.
Procuro aconchegar-me no sofá, junto à lareira acesa. Refugiar-me... junto ao calor. Procuro manter-me quente. A música parece sucumbir à melancolia. A luz parece abater-se sob o peso do mesmo sentimento. E ali fico, à espera.
Chegaste. Com o teu sorriso iluminaste a sala. Prendeste o meu olhar e não mais o soltaste. Envolveste-me num abraço do tamanho do mundo. Falaste. Respondi com silêncio. Não procuraste resposta. O meu silêncio bastou.
Senti os teus braços envolverem-me num abraço sem medida, sem tempo. Ficamos assim, os dois, em silêncio... falando. Aos poucos, invade-me o calor do teu abraço, do teu corpo. Combate a melancolia. Afasta-a de mim.
Encontro o teu olhar. Abraço o castanho profundo... e mergulho no teu sorriso. Beijas-me a pele. E com cada beijo, mostras que me amas.