Corro. E como corro. Corro pelo prazer de correr. Pelo prazer de caçar. Corro firme no objectivo que me guia pela noite fria. Corro cada vez mais. E mais. Salto. Uma e outra vez. Salto. Sinto a textura da madeira, da pedra, da terra. Absorvo cada detalhe. Registo cada movimentação. O instinto animal à flor da pele. O prazer, sempre o prazer.
A inteligência. A persistência. A atenção nos detalhes e a inabalável paciência. Aqui estão as razões do nosso sucesso.
Vislumbro mais à frente uma bifurcação no caminho - corro ainda mais, sem saber porquê. Encontro-te. Vinhas a correr, fazendo uso da tua forte musculatura. De porte maior que o meu, quase que esbarramos um no outro. Desprevenida, e ao mesmo tempo deliciada por este encontro, salto.
Salto! Cravo-te os dentes. E afasto-me. Sinto o sabor do teu sangue na boca. Aos poucos, vai-se envolvendo com a saliva, e o sabor do teu sangue, penetra-me lentamente no corpo. Mordes-me em resposta. Sinto os teus caninos perfurarem-me a pele, e o sangue a brotar. Não estremeço: já estava a espera. Enquanto que eu lambo o teu sangue, e o saboreio, tu manténs-te impávido, e sereno. Gotas do meu sangue e da tua saliva tombam sobre a terra quente e húmida. Não lambes, não saboreias, mas sinto que o meu sangue também se entranha no teu corpo, aos poucos, lentamente.
Mantemos o olhar fixo um no outro. Muitos dizem que os nossos olhos brilham no escuro, poucos porém percebem que nos servimos deles para comunicações mais delicadas. Movimentos minúsculos da musculatura ocular bem como mudanças no tamanho das pupilas, expressam surpresa, perigo, alegria, reconhecimento e outras emoções.
Há muito que nos observamos mutuamente. Há muito que nos estudamos.
Parados, imóveis, todavia atentos, ao mínimo movimento, a cada detalhe - e por dentro, o sangue em ebulição, os músculos a ferver com a adrenalina resultante deste encontro.
Há muito que te sigo. Há muito que me chamaste a atenção. Há muito que o meu objectivo... és tu. Mais jovem, impetuosa, dou um passo para a direita - tu, em resposta, não moves um único músculo. O que resultará deste encontro?