# 45 When a tornado meets a volcano
O dia parece soçobrar pelo peso da noite que impiedosamente se abate sobre ele. O céu parece querer libertar as águas que aí aprisiona. Querer. Até o céu tem querer. O mar que retumba sem parar, parece agitado, não pela força do vento estranho que lhe escarpa as ondas, mas pela tempestade que se quer formar. Querer. Há um querer que se foi alimentando durante o dia, sorvendo tudo à sua volta, acrescentando, engolindo tudo em que toca, encrespando-se na crista de um tornado, impulsionado pela demora de ter. De te ter.
just gonna stand there and watch me burn
that’s alright because i like the way it hurts
A sala quente, crepitante, vibra quase silenciosamente nos aromas de laranja e canela, nos tons alaranjados que a compõem. Um vulcão. És lava que me corre nas veias. Que me incendeia. E eu sou tempestade. Os meus desejos parecem comandar os ventos, as marés, a cadência da chuva e das estrelas. Abres a porta, e os ventos inflamam o incêndio que me queima a pele. E ao entrares, trazes contigo o tornado que te espera. Voas para os meus braços, e é o meu fogo que te queima a pele. Sou eu que te consumo, que te quero consumir, que me consumo a mim própria contigo. Em te querer. Querer. Este querer que balança no ar, contagiando-nos, aliciando-nos, iludindo os sentidos.
Os corpos envolvem-se numa dança que conhecemos tão bem. Sabem de cor os passos, mas sinto-os improvisar a cada toque, a cada arrepio. O sabor da pele dita o compasso da entrega. De te receber. De te ter.
E os meus braços perdem-se nos teus. A minha boca palminha o teu corpo, tacteando cada centímetro, na escuridão intrincada. O meu cheiro dispersa-se no teu. O teu sabor grava a passagem por cada recanto do meu corpo. Os teus dentes marcam-me os ombros. As minhas unhas marcam-te as costas. Cedemos. Soçobramos sob a fúria que se abate sobre nós. Somos tempestade. Somos.
Encostamos os corpos suados à vidraça gotejante da sala. O mar, lá fora, reage à provocação da cadência dos nossos corpos desnudos. Vergamos os corpos ao desejo, amamos, sugamos a vida, consumimos a energia sem fim. Pára. Sentes? Juntos originamos um terramoto violento, cujo epicentro se forma aqui mesmo. Aqui. E agora.